domingo, 21 de setembro de 2014

Vida que segue

Um dia, penso eu, alguém poderá vê-la como eu vi.

Usei-a como quem usa uma roupa de domingo. Respeitosamente, porém apenas com um propósito. Pensei nela como mãe dos meus filhos. Pensava em velhice, em família, em sexo. Pensava até em carinho…

Dessa mulher eu sei pouco, ou sei até demais. Das duas uma, então irei pela presunção que persegue o ego de qualquer ser humano.

Não temos história… Hoje vejo. Temos desentendimentos, encontros marcados, marcantes… Tivemos, inclusive, certa dose de paixão.

Penso nela com desgosto. Ou melhor, um amargo na boca que não me deixa sorrir. Em mim, com raiva. Pois quem há de ter sido tão burro quanto eu? Que me forcei a enxergar coisas que nunca deveria ter visto… Agora vejo. Vejo e não sou mais feliz por isso.

Nos bares, éramos unânimes. Ainda somos. Mesmo não sendo. Há ainda algo como a lembrança do roçar de sua saia nos meus sapatos engraxados e na calça engomada.

Por esses dias, ela dança com outros. Eu sempre vou assistir. Gosto de me esfregar na cara as ilusões e os iludidos.

Hoje olho todos e quase grito “CEGOS!”. Mas logo me recomponho, lembro que há horas atrás o bobo era eu. E ela era apenas ela. Ela que nunca se escondeu. Nunca teve vergonha. Ela que nunca mentiu. Ela que sempre dançou com perfeição a todas as músicas que tocam no salão. 

Com quem queria. Até não querer mais. E um dia me quis. Ela sempre foi ela. Eu vi outra. Eu quis que fosse outra. 

O erro foi meu, mas a culpa foi dela. O erro foi dela, mas a culpa foi minha.

Ou os dois… Talvez ainda tenha jeito. Talvez ela nunca vá ser mais nada além do que exatamente aquilo que é.

Quem sabe não desiste da Salsa. Quem sabe ainda não dançamos um Tango? Quem sabe…

Mas o que eu quero agora, é vê-la girar, girar e girar pelo salão, passando de mão em mão e passando por mim sem piscar.

Vida que segue. 

Vida que seguiu.