terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

“O senhor vai consertar o meu irmão?”

“O senhor vai consertar o meu irmão?”, questionou a menina de uns 6, 7 anos máximo.
Omissão, mentira... Várias opções e artifícios que já lhe vinham à mente. Todos, em teoria, eufemismos de fácil execução. E Dimitri era, provavelmente, o mais indicado para usar qualquer um deles. Sabia o quanto uma criança poderia ser sensível e perceptiva aos mínimos detalhes de uma fala ou franzir de cenho. 
Entretanto, um suspiro no tempo errado ou uma pausa inadequada entre declarações e... pronto. Estaria feito o estrago.
Cuidadosamente, chegou mais perto da pequena e desceu até encostar os joelhos no chão, inclinando-se um pouco para olhá-lá bem nos olhos castanhos, brilhantes, quase vítreos de tão arregalados.Agora, mais do que nunca, sentia o peso da profissão nos ombros, arqueando-o para frente, cansado. Anos de estudo, suor e dedicação... Mas no final era aquele momento, e nenhum outro antes dele, que lhe fazia compreender as implicações do elegante diploma jogado no canto de seu quarto. Talvez por isso nunca houvesse ousado sequer emoldurar o tal pedaço de papel...
Respirou fundo. Sem perceber, as palavras fluindo de seus lábios, ternas como veludo.
Observou a menina empertigar-se. Os últimos segundos pareciam tê-la envelhecido ao ponto de ter rugas e fios brancos.

"É um caso delicado..."
Se ouviu dizer, enquanto ela balançava levemente a cabeça, compreendendo até mesmo o que não lhe era dito.
“Estamos fazendo o possível...”
Céus! Era tão nova ainda... Nova demais pra ter que lidar com vida e morte, pensou Dimitri, atordoado, tentando conter-se de tomar para si a dor que o encarava fixamente em um vestido rosa puído.
A jovem, com ares de atriz prestes à encenar um grande papel, soltou-se do agarre silencioso que a mantivera ali, escutando-o, e seguiu para o quarto no qual seu irmão repousava.
Dimitri levantou. Em seu rosto o reflexo das lágrimas que pendiam no rosto da menina, sem nunca cair, e nos lábios, o sussurro da frase que ela não quis ouvir...
"... mas nem sempre é o suficiente."

Um comentário:

  1. Lindo, Tamara! Sensibilidade e poesia são a essência da tinta que molha a pena do artista, deixando-a correr livre pela folha em branco, preenchendo-a de sons, imagens e cores. Seu texto foi produzido com esta tinta e faz de você uma artista da palavra. Parabéns!!!!

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