segunda-feira, 19 de março de 2012

"Poème de l'amour et de la mer"

I. La Fleur des eaux
Não sei se é a bebida, o sotaque... ou se é mesmo 'só' Paris... Talvez seja o ar da cidade, que mesmo sujo (ainda) consegue exalar um misto de romance e luz, dentre as nuvens que cercam os céus no período invernal... "Ah Paris...", eu suspiro, pensando que estou finalmente compreendendo a magia do lugar. As ondas batem no barco. Estou no Sena e nem acredito. Embalada por um jazz instrumental suave e um gosto forte de champanhe na boca, olho pela janela e pergunto como posso me sentir em casa, estando tão longe do lar. Mas o Sena brilha aos meus olhos enquanto desisto de encontrar a lógica de sentimentos inexplicáveis.
"É lindo demais", sussurro, mais para mim do que para o rapaz ao meu lado. Mas não o impede de me olhar e sorrir. Não entende minha língua. Quase nada, entretanto, visivelmente compartilha de meu entusiasmo.

Ia. Interlude
O barco estava abarrotado, mas o barulho não penetrava nosso silêncio. "Estou em Paris", repeti, agora em inglês, brindando com o 'estranho'.
"Cheers", ele disse. Também estava fascinado, chocado com a profundidade da beleza parisiense, a qual apenas a luz noturna deixava transparecer.
E eu que achava a impaciência de Londres atrativa... Mal sabia eu da charmosa lentidão de Paris, com seus vinhos, luzes e passarelas urbanas... O uso do guarda-chuva está fora de questão. Os sortudos de verdade ainda hão de sentir as gotas de chuva escorrendo pelos fios de cabelo... A moda em Paris é existir, comer um bom croissant, vestir a roupa que o humor ditar e sair à noite, andando pela ruas, sem compromisso ou destino definido.
Era assim que eu me sentia: "livre, leve e solta", como se nenhuma de minhas responsabilidades pesasse o suficiente para me prender. Marco, eu podia ver, sentia-se da mesma forma. As adoráveis covinhas em suas bochechas e a maneira casual com a qual deixava o vento bagunçar seus cabelos negros, ainda molhados pela chuva, denunciavam seu estado de espírito.
Morava em Paris há "thirteen years", declarou em um inglês perfeito, e cada noite era como se a visse pela primeira vez.

"Isn't that what poets would call 'love'?"

Encarei-o. Conhecia-mo-nos há pouco mais de sete dias, então como poderíamos ser tanto um para o outro? Irmãos, amigos, amantes... Em verdade, nunca nos classificamos. Sempre fomos, desde o início, mais do que mera convenção.

"Maybe"

II. La Mort de l'amour
Nossa voz era mansa. A conversa, tranquila. Seguíamos ambos no ritmo cambaleante do Sena, sem pressa de aportar. Tomei mais um gole de champanhe, apreciando o toque da taça de cristal em meus lábios. Sorri ao perceber-me sendo observada. Marco exalava felicidade. Pela primeira ver, segundo ele, presenciava meus "olhos brilhantes de criança aventureira". Chamei-o de bobo e ri, sabendo que não entenderia e tampouco se incomodaria com isso.
Parei de rir, de súbito, e suspirei, extasiada pela presença do 'estranho'. Uma tristeza pairava no ar. Sabíamos que teria um fim - sempre tem. A presença não seria eterna, assim como o brilho do Sena desapareceria com a chegada da manhã...

"L'amour..."



obs.: O título (e os 3 subtítulos) fazem referência à ópera "Poème de l'amour et de la mer", de Ernest Chausson

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