domingo, 8 de setembro de 2013

Banho

"A água caía e escorria por seu rosto. Mas não estava chorando. Não chorava porque não era fraco. Sempre resolveu sua vida sozinho e muito bem, obrigado. Sempre tivera o esmero, inclusive, de livrar-se de qualquer pessoa ou coisa que ameaçasse o conforto da sua independência. Ele era o seu próprio tripé. Não precisava de ninguém. Tinha a si mesmo e fora o bastante durante todos esses anos. Porque, então, se sentia tão... perdido? De repente parecia assustadoramente solto, em uma estrada da qual nunca ouvira falar, sem carro ou GPS.
Dizer que estava entorpecido parecia simples demais. O calor frio da água na pele não alivia a dor e o crescente incomodo físico de ter a mente tão cheia ao ponto de estar vazia.  

Era como se dentro do caixão fechado de sua mãe tivesse ficado presa a parte dele que seguraria o choro e seguiria em frente com seus afazeres do dia-a-dia. Tentou sorrir. A parte que ficara pra trás era tão trêmula e instável que sequer conseguia forças para fechar uma torneira... 
Tudo ao redor formigava, envolvendo problemas, sem jamais tocá-los. Pairava uma perspectiva um tanto quanto trágica - e real - de que não tinham solução. E por mais que precisasse respirar, parecia muito mais fácil apenas permanecer ali, parado, esperando que a água do mundo se esvaísse pelo ralo do banheiro com o que quer que tivesse restado dele e do que pensou ser. "

3 comentários:

  1. Quase escrevi um "muito bom", mas não tem nada de bom e é o mérito, muito pesado, muito pesar.

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  2. Dá-lhe dona Tamarinha... Cada vez melhor. Amei o calor frio. Este texto dá uma prova e tanto. Só não uso porque não está registrado.
    Bjs!
    Catarina

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  3. Já arrisco o excelente, como sempre, pois as sensações que exprime em palavras o que não viveu, decerto, mostram uma sensibilidade em observar o outro e, mais ainda, se importar com os sentimentos, emoções e sensações ao redor

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